Tu estás.

É complicado abandonar aquilo que nós conhecemos como parte da nossa vida.

Mais do que um passatempo, um trabalho ou uma profissão, algo que conhecemos como forma de encarar o dia-a-dia e motivo de grande parte daquilo que somos, o ser. É complicado olhar à nossa volta e perceber que mesmo depois de todas as voltas que demos, todas as vezes que nos levantámos antes da contagem final, todas as vezes que ficámos tão cansados que já dávamos por nós a correr de boca aberta e de olhos fechados, todas as vezes que o suor dividia a nossa cara com lágrimas, felizes e tristes como é normal numa relação a dois, todos os momentos que pensámos que não iriam acabar e seriam apenas um passo em frente para algo melhor, perceber que tudo isso não é nada… Perceber que tudo isso já não é nem poderá ser mais.

É apenas isto que sobra no fim de tudo aquilo que já vivemos. Apenas ficamos com as lembranças e sonhos por realizar. Não é grande coisa para ficar com, certo? Mas olhar à volta e perceber que os nossos pares à muito que largaram essas lides e que fomos só nós… Quantas vezes só nós… a manter de pé uma ponte de Marco Pólo que não passava, na realidade, de um conjunto de vigas onde passeávamos sem saber que mais tarde ou mais cedo o piso iria desaparecer e cairíamos na triste e humilde realidade de não sermos mais do que algo de que os nossos próprios sonhos se envergonhariam.

Tantas histórias foram ficando ao longo do tempo que nós próprios nos tornámos em histórias, mitos e lendas.

Fomos criando algo maior que nós onde nos apoiávamos para parecer mais altos, quando na realidade os nossos pés estavão num buraco que não findava e ficava cada vez mais fundo. Acreditámos uns nos outros quando dizíamos que iríamos fazer história, capazes de mudar tudo.

Iríamos mudar o mundo.

Iríamos dominar o mundo.

O mundo aplaudiria os nossos egos gigantes que brilhavam no alto, mas não esquecer, que estavam apenas apoiados em algo falso. Os aplausos? Esses podem ter chegado, mas não estávamos no alto para eles, apenas num buraco para tudo. Num buraco escuro e solitário onde era fácil acreditar que éramos intocáveis no seio daquilo por que vivíamos.

O buraco foi esvaziando e hoje em dia está ainda mais fundo, ainda mais escuro e totalmente solitário. Com marcas nas paredes das pessoas que subiram e partiram rumo a algo mais. A outras verdadeiras alturas ou a mais fundos e imundos buracos.

Mas não tu.

Tu ainda lá estás.

Estás escuro, no fundo e totalmente solitário.

Mas estás.

Tu estás.

samurai1uz91

About Rúben Branco

Comediante desde 2015, estou no youtube a fazer cenas. Ver todos os artigos de Rúben Branco

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